A Prefeitura de São Paulo construiu um muro na Cracolândia,
no Centro da cidade, para delimitar uma área e confinar os usuários de drogas.
A construção, de cerca de 40 metros de extensão e 2,5 metros de altura, fica na
Rua General Couto Magalhães, na região da Santa Ifigênia, perto da estação da
Luz.
Os usuários, agora, se aglomeram atrás do muro, em uma área
que também é cercada com gradis pela gestão municipal, na Rua dos Protestantes.
Os gradis vão até a Rua dos Gusmões.
A prefeitura argumenta que a construção, dentre outras
medidas, ocorreu para melhorar o atendimento dos usuários, garantir mais
segurança para as equipes de saúde e assistência social e facilitar o trânsito
de veículos na região.
A administração municipal diz ainda que, entre janeiro e
dezembro de 2024, houve redução, na média, de 73,14% de pessoas no local.
Para um representante do coletivo Craco Resiste, no entanto,
o muro fecha "um triângulo no fluxo" e cria um "campo de
concentração de usuários".
Com o muro e os gradis, a região vira um triângulo cercado.
Em tese, os usuários são livres para sair e entrar no local, mas, segundo
ativistas, são direcionados pelos guardas civis sempre para a mesma área.
Para entrar no cerco, eles passam por revistas, que seriam
para retirar coisas ilícitas, segundo ativistas.
'Encarcerados'
Para Roberta Costa, da Craco Resiste, o muro foi levantado
para manter os usuários no espaço e "cobrir" a visão da Cracolândia
para quem passa de carro pela Rua General Couto Magalhães.
"A gente vive hoje na cidade uma cena absurda e bizarra
de violência contra as pessoas que estão desprotegidas socialmente. É uma coisa
que não vem de agora, já faz muitos anos que o poder público viola essas
pessoas", critica.
Na avaliação dela, a situação só piorou. "O que a gente
viu acontecer no ano passado está num nível muito bizarro, que, inclusive,
parece visualmente um campo de concentração", diz.
Roberta afirma que o muro "encarcerou" os
usuários, e os movimentos de direitos humanos são impedidos de entrar na área
para prestar serviço a eles. Ela conta que tentaram fazer uma ação de Natal no
dia 22 de dezembro com frutas, comida e arte, mas foram impedidos de se
aproximar dos usuários.
Não cuidam e também nos impedem de cuidar. Esse triângulo é
delimitado por esse muro que foi construído para as pessoas com carro não verem
as pessoas que estão ali. E quem quer sair das grades ou ficar na calçada – do
outro lado da rua – é comum receber spray de pimenta na cara para voltar para a
grade.
— Roberta Costa, da Craco Resiste
De acordo com os documentos da Subprefeitura da Sé, o muro
começou a ser erguido no final de maio e foi concluído no final de junho. O
aceite definitivo da obra pela subprefeitura, feito após a inspeção do local,
ainda não aconteceu, segundo o processo administrativo.
Usuários se espalham
Enquanto houve redução de pessoas no fluxo da Cracolândia,
outras regiões da capital registraram o surgimento de aglomerações de
dependentes químicos.
São os casos da Avenida Jornalista Roberto Marinho, na Zona
Sul da capital, e da Rua Doutor Avelino Chaves, na Vila Leopoldina, Zona Oeste
Atualmente, na região central da cidade, o fluxo confinado
pelo muro na Rua dos Protestantes é considerado o único ativo.
Reportagem da TV Globo mostrou que a média diária de
usuários presentes no período da manhã foi de 511, em 2023, para 144, em 2024.
Já à tarde e à noite, a média caiu de 467 para 149 pessoas.